Um grupo de ativistas decide protestar contra uma loja de departamentos que utilizaria madeira extraída ilegalmente da Amazônia. Logo, invadem uma loja e se escondem até a madrugada, quando começam a pichar e destruir produtos. Seu slogan, Wake Up (“Acorde”) corresponde ao título original do filme. Mas logo percebemos se tratar, na verdade, de adolescentes de pouca consciência política, mais interessados em brincar na loja fechada do que em reivindicar alguma transformação na política empresarial da Home Idea (cujo nome remete, é claro, a Ikea).
Frente aos jovens que patinam pela loja e fazem guerra de almôndegas, existem dois seguranças, irmãos, muito preocupados em manter o emprego. Um deles teme ser repreendido por beber demais em serviço, e o outro, pelo excesso de violência nas abordagens anteriores. Entretanto, descobrimos que são duas figuras perversas, especialmente este último, apaixonado pela “caça primitiva” — o ato de capturar animais com armas elaboradas domesticamente, a partir de pedaços de madeira, por exemplo.
A questão animal é abordada com clareza evidente pelo coletivo RKSS – Roadkill Superstars, que inclui François Simard, Anouk Whissell e Yoann-Karl Whissell. Os militantes atrapalhados protestam em nome da natureza, vestidos com máscaras de animais, e serão caçados por um sujeito que os enxerga como presas fáceis no local trancado. Como se a analogia não estivesse clara o bastante, o vilão maníaco dispara, na segunda metade da trama: “Somos todos animais”. Sim, compreendido, obrigado.
Um problema diz respeito à falta de empatia dos criadores em relação aos personagens. Todos são considerados ridículos, incapazes de funcionar socialmente. Assim, quem se importaria com suas mortes?
Um primeiro problema, essencial, diz respeito à falta de empatia dos criadores em relação aos personagens. Nem os invasores, nem os seguranças, adquirem o mínimo de humanidade ou construção psicológica. Uns são tolos e ingênuos, outros são impiedosos e agressivos, então o roteiro dispõe as cobras e os ratos (os ativistas são chamados literalmente desta maneira) num espaço limitado, apenas para vê-los se matarem. É difícil o espectador se importar com qualquer um deles ali dentro. São considerados ridículos, incapazes de funcionar socialmente. Assim, quem se importaria com suas mortes?
O segundo problema, decorrente do anterior, se encontra na ausência de lógica em diversas ações apresentadas no longa-metragem. Talvez pelo desprezo manifestado em relação aos personagens, os criadores tampouco confiram muita atenção à coerência de seus gestos. Os adolescentes pretendem quebrar a loja inteira durante a noite, mesmo sabendo que existem dois seguranças presentes, com câmeras em todos os cômodos. Ora, eles não imaginavam que poderiam ser pegos? “Eles devem estar bêbados, ou dormindo”, pressupõe o líder Ethan (Benny O. Arthur). Com que base ele teria tirado esta conclusão?
Em seguida, as presas ficam chocadas ao descobrirem que as portas estão trancadas, embora tenham visto os seguranças fechando-as poucas horas atrás. O brutal Kevin (Turlough Convery) inventa e instala armadilhas de grande complexidade, sabe-se lá como, encontrando de imediato as caixas com os objetos necessários, dentro de um depósito imenso. Gosmas fluorescentes e outros itens pouco comuns encontram-se à disposição.
Ao interromper uma torre local de eletricidade, o sujeito aparentemente impede que os personagens tenham acesso ao 4G de seus celulares. Os jovens besuntados em tinta fluorescente brilham em frente à câmera, mas desaparecem na escuridão a poucos metros de distância. Uma pessoa tida como morta, após perder muitos litros de sangue, se levanta e continua andando como se nada tivesse acontecido. Um jovem rastejando entre as cabines do banheiro não é percebido pelo homem à sua frente. A lista poderia continuar, com dezenas de itens. Parte-se do pressuposto que o terror justifica qualquer coisa.
Em termos de ritmo, pelo menos, a empreitada se mostra bem-sucedida. Com menos de 90 minutos, os RKSS compilam várias mortes e reviravoltas ao longo de uma única noite, até a conclusão surpreendentemente cínica. Os autores se divertem com a carnificina, ao invés de questioná-la ou problematizá-la. Neste sentido, aproximam-se de outros criadores de torture porn, como os cineastas de Jogos Mortais e O Albergue. Aqui, os indivíduos constituem corpos enviados ao abatedouro. O prazer reside em vê-los sucumbir; não em escapar do perigo.
Parte da crítica tem taxado Hora do Massacre de filme reacionário, pela maneira como trata os ativistas “de esquerda”, devidamente imbecilizados e de frágil desenvolvimento ideológico. Ora, o filme também despreza essa direita raivosa representada pelos seguranças, dois tipos brutos e ineficazes. Despreza a vizinhança ao redor, o sistema de polícia. O trio de autores concebe o espaço da loja de departamento apenas como tabuleiro de jogo — e este cenário recebe o único afeto genuíno por parte dos cineastas. De resto, o desdém se prova generalizado.
O resultado possui alcance limitado enquanto mensagem ou discurso. Não se interessa de fato pelas pautas ecológicas dos ativistas, nem pelo direito à violência dos funcionários. Para os RKSS, o único prazer seria de ordem estética: como iluminar um galpão escuro? Como destacar as figuras que tentam se esconder? Como criar armas potentes a partir de itens domésticos? Como conceber a fuga num local de portas trancadas e vidros espessos? Surgem então as luzes fluorescentes, os patins para que a câmera deslize pelos espaços, o uso da profundidade de campo infinita, para que o espectador imagine alguma ameaça surgindo no fundo dos corredores.
O único personagem bem construído, ao final, será a Home Idea. Apesar de destruída e acusada de gestão desumana, ela se sobressai enquanto local lúdico, onde qualquer jogo se torna possível, bastando a imaginação do consumidor. Os autores propõem um cinema niilista e esteta, no qual corpos humanos servem a rechear as cenas e jorrar sangue para colorir o chão cinzento. Mas o foco, de verdade, se encontra nas possibilidades infinitas deste galpão gigantesco e sem clientes. O caráter animalesco se estende, de maneira voluntária e lúdica, ao olhar da direção.