No subgênero das coming of age stories (histórias de passagem à fase adulta), diversos elementos podem despertar no adolescente a percepção de adentrar a maturidade. O fim de um relacionamento amoroso, o enfrentamento de uma doença ou morte, a reaproximação involuntária com algum membro da família são catalisadores clássicos para a descoberta de que crescer equivale a lidar com temas e situações difíceis. Se as crianças ainda são protegidas de dilemas sociais e familiares, adultos precisam enfrentá-los.
O costa-riquenho La Piel del Agua combina todas as possibilidades acima numa jornada só. Aos quinze anos, Camila recebe a notícia de que a mãe sofreu um acidente e está internada em estado grave. Ao mesmo tempo, descobre a paixão repentina por um músico rebelde, e se vê obrigada a morar temporariamente com o pai que nunca cuidou dela. Em questão de poucos dias, sua vida se transforma por completo, levando a garota a fugir de casa, beber muito nas festas e ignorar os deveres escolares. A rebeldia se traduz em consequência óbvia da incapacidade de gerenciar a crise.
A diretora Patricia Velásquez opta por algumas ferramentas consagradas do cinema independente, em especial, de vertente norte-americana. Não seria uma surpresa se ela tivesse se baseado em inúmeras referências para escolher o formato de tela próximo do quadrado, a câmera na mão para captar as andanças da jovem, os enquadramentos com a garota no centro da imagem, ou Camila e o namorado posicionados nos terços exatos do quadro. Durante as noites de música e bebedeira, a direção de fotografia desfoca as bordas da imagem e o fundo por trás da protagonista — para sugerir, como de costume neste caso, uma desconexão com o meio e a dificuldade de enxergar os dilemas ao redor.
O drama transparece um humanismo discreto. Em contrapartida, soa tão competente quanto impessoal, genérico, semelhante a centenas de dramas de premissas idênticas.
Na prática, não existe nada errado ou questionável com estas escolhas. O drama transparece um humanismo discreto, evitando julgar moralmente a garota pelos gestos bruscos, e tampouco vilanizando o pai pelas atitudes erradas no passado. O comportamento compreensivo da nova esposa do pai, a recusa da meio-irmã mais nova em dividir o quarto e a solidariedade da colega de classe se aproximam de um naturalismo bem orquestrado em termos de ritmo e verossimilhança. Acredita-se com facilidade naquelas pessoas e em seus comportamentos. Pode-se falar numa crônica-padrão da classe média.
Em contrapartida, o longa-metragem deixa de oferecer qualquer ousadia ou posicionamento pessoal em relação aos temas abordados. Soa como uma obra tão competente quanto impessoal, genérica, semelhante a centenas de dramas de premissas idênticas. Neste caso, as comparações se tornam inevitáveis — em detrimento do filme costa-riquenho. É curioso que algumas obras fraquíssimas soem mais corajosas do que aquelas limitadas a uma mise en scène acadêmica, domesticada. Lembra-se dos filmes péssimos que partem de iniciativas arriscadas; já os filmes mornos se diluem nos mares da memória cinéfila.
La Piel del Agua se prova excessivamente dependente de catástrofes e elementos externos para se desenvolver. O acidente da mãe; o pai se deslocando com dificuldade em muletas; o choque posterior envolvendo o namorado. Cada noite nas festas resulta em perigos ou vômito; cada encontro amoroso precisa combinar luto pela mãe com perda da virgindade e aceitação do pai ausente. Velásquez evita se concentrar nas pequenezas, no cotidiano e na simbologia, condensando numa única aventura todos os temas sociais que gostaria de abordar. Prefere se concentrar na ação do que na dúvida, na hesitação — há conflitos demais para psicologia de menos. Em menos de 80 minutos, despeja mais conflitos do que poderia gerenciar a contento.
Ao final, desperta uma sensação ambígua: deve-se felicitar os criadores pela competência evidente de diversas cenas, e pela atuação correta de Ariana Chaves, ou lamentar tamanho investimento num projeto previsível? Ainda na esteira dos Jogos Olímpicos, o filme seria o equivalente a uma apresentação de ginástica olímpica que sai com nota de dificuldade bastante baixa, e depois executa com competência os modestos movimentos propostos. Erra pouco, mas também acerta pouco.
Em se tratando de uma cinematografia nacional de escassos longas-metragens que viajam pelos festivais afora, a opção pela segurança dificilmente soa como a melhor forma de apresentar uma cultura e um ponto de vista. Por que incluir poucos elementos especificamente costa-riquenhos na viagem de ambição universal (considerando que é preciso “falar de sua aldeia para falar do mundo”?). O projeto desperta mais questionamentos acerca de suas intenções e conceitos do que pelo resultado apresentado em tela. Afinal, o que Velásquez e sua equipe pretendem transmitir ao espectador com esta forma bem-comportada de audiovisual?