Paula (Thalita Carauta) acaba de terminar um relacionamento traumático com um homem abusivo. Luciana (Karina Ramil) está envolvida com um sujeito que nunca assume de fato a união, e insiste em afirmar que ambos vivem uma “relação aberta” — embora as regras tenham sido determinadas unicamente por ele. Fabiana (Verônica Reis) convive com um marido controlador, que a mantém por perto sob pretexto de melhor protegê-la.
Os Sapos faz com que estas três mulheres se encontrem durante um fim de semana, numa chácara. O projeto ainda sustenta, em 2025, a aparência de “filme de pandemia”, isolando um pequeno grupo de personagens num local ermo, com o qual interagem pouquíssimo. O roteiro nunca esconde suas origens teatrais, deixando que os diálogos pautem a quase totalidade da dinâmica em cena. De certo modo, lembra bastante a estrutura de Domingo, também da diretora Clara Linhart (em parceria com Fellipe Barbosa), baseado na ciranda de amores e desavenças de um grupo de amigos durante um feriado.
Mantém-se, neste caso, uma noção simples, direta e funcional de mise en scène. A maioria das cenas se resolve com poucos planos, o mínimo de decupagem ou movimentação possível da câmera. Os personagens estão sentados ou de pé, em grupos de dois ou três, expondo verbalmente seus tormentos e anseios. É difícil apontar uma única imagem que se sobressaia, algum gesto mais ousado de enquadramento, composição, de deslocamento de personagens ou demais elementos na imagem. Os cinco protagonistas se limitam a transitar da cozinha ao quintal, da sala ao banheiro.
Nunca se busca nenhuma forma de ambição formal e narrativa para além deste momento de iluminação, quando as mulheres se enxergam umas nas outras durante um fim de semana, e começam a perceber a prisão masculina em que se encontram.
Ao mesmo tempo, a proposta singela se assume como tal. Nunca se busca nenhuma forma de ambição formal e narrativa para além deste momento de iluminação, quando as mulheres se enxergam umas nas outras durante um fim de semana, e começam a perceber a prisão masculina em que se encontram. Para a epifania ser rápida, didática e eficaz, é preciso acelerar processos, pular etapas, ir direto ao que interessa. Os Sapos é um drama bastante econômico, mas também pouco aprofundado, devido à incapacidade de filmar a dúvida, a hesitação, e mesmo as relações de causa e consequência.
Assim, um homem obsessivo agarra uma das mulheres à força. Ela se desvencilha, no entanto, carrega de imediato o trauma da violência. Na cena seguinte, a colega sofre abuso semelhante do outro rapaz, reproduzindo a reação da protagonista. Abruptamente, uma mulher se vira para a outra e confessa: “Eu estou doente. É grave”. O que seria do drama cinematográfico sem este recurso espetacular da personagem-à-beira-da-morte, revelando a sua dor para despertar espanto e piedade no espectador? Sobretudo nos casos em que a suposta doença não se manifesta de maneira nenhuma no corpo?
Outros recursos também chamam a atenção, ao limite do incômodo. Marcelo e Luciana tratam-se por “sargento” e “coronel”, uma piada com a qual a mulher não concorda inteiramente. Trata-se de um símbolo de sua submissão ao parceiro, ilustrando a incapacidade de impor suas vontades e seus limites. Mesmo quando a gag se tornou clara, ela retorna duas, três, seis, dez vezes, esgotando-se por completo. As mulheres repetem “Eu estava precisando disso”, pelo menos três vezes. Existem insistências, além de inconsistências e facilidades (o show musical cancelado sabe-se lá quando; os dois poemas das mulheres, que provavelmente visavam um impacto dramático mais intenso).
Felizmente, o longa-metragem conta com boas atuações, em especial, de Thalita Carauta. A grande atriz sempre rouba a cena nos filmes em que participa — mesmo em pequenas participações, caso de O Lobo Atrás da Porta) — e demonstra neste projeto sua capacidade impressionante de imprimir variações, sugestões e insinuações, em simples gestos do olhar. O flerte discreto com Cláudio no primeiro encontro e a simplicidade na troca com Fabiana revelam o grande talento de Carauta no tratamento de diálogo, na desenvoltura do corpo, e nesta linha tênue entre o humor de desconforto e a crônica cotidiana. O filme se fortalece sempre que a câmera se concentra em sua presença.
Os atores também se esforçam para não transformar as figuras masculinas em tiranos desalmados — apenas tipos mais ou menos embrutecidos, reproduzindo uma lógica de dominação que herdaram dos referenciais masculinos em suas vidas. Existe mesmo certa ternura em Pierre Santos, que interpreta um sujeito inconsequente, ignorando por completo que seus gestos possam soar abusivos. A trama se complexifica nesta relação intricada com a violência conjugal — e também na solução do roteiro, evitando saídas fáceis, e ciente de que muitas mulheres demoram bastante tempo para romper ciclos tóxicos com os parceiros.
Por fim, Os Sapos se mostra um filme simples, pequeno, curto — curtíssimo, aliás. Ele cumpre bem o pequeno papel que atribui a si próprio, voltando-se ao ponto de vista feminino, e plantando uma semente de conscientização que florescerá na vida destas mulheres em algum momento posterior à narrativa. Seria interessante encontrar uma iniciativa com maior ambição estética e visual, pensando em enquadramentos, luz, sons, cores capazes de representar tamanha solidão e incômodo, ao invés de depender unicamente de diálogos e dos jogos de cena convencionais. Mesmo assim, o saldo é positivo.