Mostra de Gostoso 2022: Ainda restarão sonhos na periferia?

Se a noite de sábado na 9ª Mostra de Cinema de Gostoso trouxe filmes repletos de ternura (A Filha do Palhaço) e de provocação (Noites Alienígenas), a noite de domingo foi bastante diferente. Desta vez, o longa-metragem apresentado ao público na Praia do Maceió, em São Miguel do Gostoso, foi o drama A Mãe (2022), dirigido por Cristiano Burlan. Na trama, uma vendedora ambulante da periferia de São Paulo (interpretada por Marcélia Cartaxo) sofre com o desaparecimento do filho adolescente. Conforme investiga o caso por conta própria, descobre a violência policial e o silêncio dos moradores diante de mais um caso de violência.

Para fugir a uma abordagem melodramática, o cineasta opta por um registro cru e duro — até demais. Ele investe em imagens silenciosas, brutas, nas quais os personagens ganham pouca oportunidade de expressar o que realmente sentem por seus familiares e vizinhos. O grito contra a impunidade, ilustrado por uma chocante cena final, se torna mais forte do que a empatia por esta mãe incapaz de realizar o luto. Resta uma obra desesperançosa, que possui a vantagem de romper com o imaginário empolgante e divertido de tantos filmes sobre a favela e a violência policial.

A Mãe

A sessão contou com outra representação das periferias, em mais uma obra paulista. Ainda Restarão Robôs nas Ruas do Interior Profundo (2022), de Guilherme Xavier Ribeiro, acompanha a jornada de Luquinha, o trabalhador de uma rede de fast-food que perde sua égua. Conforme reúne os colegas na busca pelo animal, mergulha numa cidade absurda, metafórica, repleta de bichos desgovernados e carros sem motorista, representando um embate político propício à disputa eleitoral Lula-Bolsonaro, ou da elite contra a classe trabalhadora. O que faltava em A Mãe, em termos de barulhos, dinamismo e vigor, transborda neste filme dotado de uma capacidade ímpar de filmar multidões e coletivos. O cineasta demonstra um domínio impressionante da mise en scène dentro de uma complexa estrutura gradual, que cresce até a explosão simbólica.

Na mesma noite, os espectadores puderam assistir a uma produção local: o curta potiguar A Cabaça da Criação (2022), de Altemir Avilis, Gil Leal e Ramon Bezerra. A exemplo de Cordel da Vila: a Rainha Louca contra o Escandaloso, também dirigido por Gil Leal e apresentado na Mostra Panorama, este projeto é marcado pelo encontro vertiginoso de estilos e recursos, entre fotografias em still, filmagem em live-action, animação em stop motion, cordel animado, colagens e sobreposições.

Ainda Restarão Robôs nas Ruas do Interior Profundo

Os recursos são utilizados para narrar a origem do mundo pela perspectiva dos orixás, rompendo com a tradicional cosmogonia cristã. Os ensinamentos são narrados por autoridades religiosas que dominam o assunto e explicam com clareza os acontecimentos via voz off. No entanto, os recursos frenéticos chamam tanta atenção a si próprios que distraem da linearidade narrativa. É o caso de se questionar se a linguagem trabalha em conjunção com o discurso, ou contra ele, disputando atenção com o mesmo. De qualquer modo, resta uma produção corajosa na experimentação de estilos, e dotada de uma produção competente.

Na segunda-feira, 7 de novembro, os frequentadores da Mostra de Cinema de Gostoso descobrem os filmes Castelo da Xelita e Carvão, na Mostra Panorama (às 15h), e os filmes Barraqueiros, Infantaria e Paloma, na Mostra Competitiva (a partir de 21h). Você descobre toda a grade horária e informações sobre os filmes exibidos no site da oficial da Mostra.

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