Quando Aqui (2024)

A história de um espaço

título original (ano)
Quando Aqui (2024)
país
Brasil
gênero
Drama
duração
36 minutos
direção
André Novais Oliveira
elenco
Norberto Novais Oliveira, Renato Novaes, André Novais Oliveira, Maria José Novais Oliveira, Felipe Oládélè, Matéria Prima, Natalia Neves, Lucas Azevedo, Sofia Azevedo, Italo Augusto, Danilo Souza, Wellington Cintra, João Batista de Azevedo, Yná Krenak, Shirley Djukurnã Krenak
visto em
27ª Mostra de Tiradentes (2024)

Em Retratos Fantasmas (2023), Kleber Mendonça Filho estabelece uma arqueologia da casa onde nasceu e cresceu. Estuda a importância de cada cômodo para as suas memórias afetivas e para as imagens que formariam seus primeiros longas-metragens. Em O Estranho (2023), Flora Dias e Juruna Mallon analisam os terrenos que compõem Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, desde os povos indígenas até as atuais empresas.

Um movimento semelhante ocorre em Quando Aqui (2024), de André Novais Oliveira. Cineasta dos afetos e dos espaços (ou dos afetos por espaços), ele se volta à casa de sua família, cenário de filmes como Quintal e Ela Volta na Quinta. Imagens e cenas destes projetos retornam à narrativa. Então, ele imagina: que pessoas teriam habitado estes metros quadrados antes da minha família? Antes mesmo de haver uma casa? Quem viria a habitá-la muito tempo depois da partida deles?

Em consequência, o autor combina fatos e memórias, dados e especulações. Voltando-se a 1450, relembra a existência do povo Krenak na região, representado por atores desta comunidade indígena. Dando muitos passos atrás, em 7000 a.C., supõe a existência de plantas e musgos naquela terra. Há espaço para uma ludicidade divertida neste jogo desprovido de qualquer pretensão documental. Trata-se menos de um terreno do que de um local de memória, no qual se pode investir as projeções, lembranças e desejos que convenham ao criador.

No futuro (2028, 2037, 2041), pressupõe a ocupação por um casal com a filha pequena, e depois, um casal formado por dois homens. Imagina a casa sendo repintada. A cada novo investimento humano nestas paredes e cômodos, oferece novas cores, objetos ou, inversamente, o sentimento de vazio diante de salas e quartos em desuso. O que sentiriam as casas, ao serem deixadas por seus moradores? Como se contaria a história das geografias (humanas e municipais) pelo ponto de vista das habitações?

Como se contaria a história das geografias (humanas e municipais) pelo ponto de vista das habitações?

Esteticamente, o dispositivo deste média-metragem se prova tão simples quanto eficaz. Oliveira aposta na sobreposição de imagens: fotografia sobre fotografia; fotografia sobre vídeo; vídeo sobre fotografia e vídeo sobre vídeo. Os registros da infância do diretor são sobrepostos manualmente às mesmas quinas do quintal, ou cantos da sala, onde hoje existem novos objetos, cores e luzes. Filma-se, assim, o tempo que passa, e sobretudo a distância (física e estética) entre passado e presente.

O projeto dispensa narrações em off, conversas explicativas ou quaisquer elementos didáticos para além de uma minúscula data, aplicada aos cantos do quadro: 1765, 1986, etc. Pouco importa quem sejam estas pessoas, porque chegaram, e o que as levou a partir. Convém, neste caso, que a experiência se encerre com um enquadramento-parede, sendo literalmente pintado por um novo ocupante. Neste momento, o morador se faz cineasta; e a unidade estrutural do cinema (o quadro) se confunde com a unidade estrutura do imóvel (a parede). Há uma fisicalidade simples e poética no procedimento.

Resta a melancolia de perceber que os seres humanos vão embora (ou resistem, no caso das novas gerações Krenak) enquanto as localizações permanecem. Elas constituem as verdadeiras protagonistas desta história, sobrevivendo às pessoas que lhe atravessam (graças a elas, ou apesar delas). Aqui, o lar não se faz para a família, e sim a família se constrói para ocupar os quartos e paredes e salas e cozinhas e garagens e quintais. Inverte-se a prioridade do olhar, alternam-se as relações de causa e consequência. Os elementos utilitários, no caso, somos nós.

André Novais Oliveira continua se mostrando um exímio observador dos tempos e geografias cotidianos, atribuindo a cada um deles um carinho de filho e uma atenção de pesquisador. 

Quando Aqui (2024)
8
Nota 8/10

Zeen is a next generation WordPress theme. It’s powerful, beautifully designed and comes with everything you need to engage your visitors and increase conversions.