Marighella vence o Festival Sesc Melhores Filmes 2022

O prazer e o perigo das unanimidades

Em cerimônia organizada na noite de 6 de abril, foram anunciados no CineSesc, em São Paulo, os vencedores da 48ª edição do Festival Sesc Melhores Filmes. Marighella (2019), dirigido por Wagner Moura, foi o grande vencedor da edição, com oito troféus. As recompensas incluem o prêmio de melhor filme (crítica e público), melhor direção (crítica e público) e melhor ator para Seu Jorge (crítica e público).

Deserto Particular (2021), dirigido por Aly Muritiba, recebeu os troféus de melhor roteiro e direção de fotografia segundo os críticos de cinema. Na categoria de documentários, os críticos optaram por A Última Floresta (2021), de Luiz Bolognesi, enquanto o público recompensou Chorão: Marginal Alado (2019), de Felipe Novaes.

A vitória de Marighella não surpreendeu no que diz respeito aos gostos do público — este foi o primeiro filme nacional com uma bilheteria considerável desde o processo de reabertura das salas de cinema, em 2021. Além disso, está repleto de atores populares, incluindo Wagner Moura atrás das câmeras. No entanto, pode-se questionar a concentração dos votos da crítica nesta única produção. O drama biográfico possui grandes qualidades estéticas e políticas, sem dúvida. No entanto, o consenso em torno desta obra levanta questionamentos, por integrar a safra que também trouxe os ótimos Helen, Um Animal Amarelo, Vento Seco, Valentina, A Torre, King Kong en Asunción, Cabeça de Nêgo, Meu Nome É Bagdá e Madalena.

Uma leitura possível para a ovação a Marighella por parte dos críticos residiria numa resposta simbólica às tentativas recorrentes de censura e entraves burocráticos impostos ao lançamento, liberação de verbas e análise de prestação de contas de filmes nacionais. O drama estreou no Festival de Berlim em fevereiro de 2019, mas só conseguiu chegar de fato aos cinemas brasileiros no segundo semestre de 2021, devido a uma extensa batalha institucional e burocrática jamais explicada a contento pela Ancine, pelo governo e pelos próprios produtores do filme.

No entanto, a hipótese mais realista seria a de que parte considerável dos 170 críticos votantes nem sequer tenham assistido às outras obras citadas. A popularidade de Marighella constitui razão para comemorar (com que frequência uma obra nacional desperta tamanha repercussão na cultura popular?), porém suspeita-se que muitos críticos tenham desprezado a vasta e complexa produção nacional do período. Basta constatar o estado das sessões de imprensa, sempre lotadas para blockbusters hollywoodianos, e um tanto vazias quando destinadas ao cinema nacional. Além disso, um volume importante dos votantes não frequenta os festivais brasileiros, onde os títulos independentes se destacam e constroem sua carreira.

Assim, os resultados despertam um misto de orgulho e decepção por parte da crítica de cinema. Orgulho, porque os títulos premiados constituem, de fato, obras ótimas, variadas, e dignas de destaque. Decepção, porque deixam a impressão de que nada mais foi feito e distribuído no último ano, além de Marighella e Deserto Particular. Cabe à crítica, sobretudo em tempos de crise, jogar luz às belas obras que não tiveram oportunidade de repercutir, evitando servir de mero eco aos fenômenos de bilheteria.

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